O Conselho Regional de Odontologia de São Paulo (CROSP), o Centro Colaborador do Ministério da Saúde em Vigilância da Saúde Bucal (CECOL/USP) e o Laboratório de Bioquímica da Faculdade de Odontologia de Piracicaba da Unicamp (FOP/UNICAMP) concluíram as análises do mais amplo levantamento já realizado no mundo sobre a fluoretação das águas. O estudo verificou as águas de mais de 98% dos 645 municípios de São Paulo, e concluiu que 30% estão com níveis inadequados de flúor, ou seja, três em cada dez amostras coletadas não atendem ao parâmetro de obtenção do máximo de benefício anticárie com o mínimo de risco de fluorose dentária.
O flúor vem sendo usado no mundo há 60 anos e é recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), pela Organização Pan Americana de Saúde e pelo Ministério da Saúde. O CROSP também defende a sua aplicação na dosagem correta, pois seu excesso ou falta são prejudiciais. “A correta quantidade de flúor aplicada na água combate a formação de cárie. Teores de flúor baixos não reduzem cárie. Teores altos, por sua vez, são igualmente prejudiciais, podendo levar a uma fluorose”, defende o Presidente do CROSP, Cláudio Miyake.
Se considerado o padrão adotado pela Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, balizado pela resolução SS-250 (de 1995), as concentrações em uma faixa de 0,6 a 0,8 são tidas como apropriadas. Abaixo ou acima deste recorte, são inadequadas e podem favorecer a formação de cárie ou propiciar a fluorose, respectivamente.
Já pelo padrão CECOL, referencial mais recente e considerado por diversos especialistas um modelo atualizado para este tipo de mensuração, a classificação do teor do flúor na água não é dividida apenas em “adequada” ou “inadequada”, como proposto pela resolução SS-250. Os parâmetros considerados são “benefício” ou “risco”. Ou seja, o teor de flúor na água pode beneficiar a prevenção da cárie e/ou representar risco de ocorrência de fluorose.
Na análise, pelo padrão SS-250, 71,5% das amostras de água estão adequadas, 14,5% estão abaixo da concentração recomendada e 14% estão acima. Quando as águas com concentração abaixo do ótimo são analisadas pelo referencial do CECOL/USP em termos de benefício/risco, 4,9% foram classificadas como mínimo/baixo e 9,2% como insignificante/insignificante. Logo, 9,2% das amostras de água não conferem proteção à cárie, quer seja para crianças como para adultos.
Por outro lado, quando as amostras com teor de flúor acima do nível recomendado são analisadas em termos do binômio benefício/risco, 11,9% delas foram classificadas como máximo/moderada, 1,8% como questionável/alto e 1,1% como malefício/muito alto. Assim, 1,1% das amostras de água são consideradas de alto risco em termos de provocar uma fluorose dental esteticamente comprometedora se ingeridas regularmente por crianças durante a formação dos dentes. Nesse 1,1% de amostras de águas foram encontradas concentrações de íon flúor acima de 1,5 ppm, o valor máximo permitido (VMP) pelo Ministério da Saúde.
As cidades que em todos os pontos e nos 3 tempos de coleta apresentaram concentrações de fluoreto sem benefício anticárie (<0,4 ppm F) foram: Altinópolis, Analândia, Boa Esperança do Sul, Guatapará, Ipeuna, Luis Antonio, Morro Agudo, Nuporanga, Orlandia, Pirajuí e Rio das Pedras. Já, os municípios com concentração de fluoreto preocupante em termos de fluorose (>1,4 ppm F) foram: Cesário Lange e Pereiras.
Problemas de irregularidade da fluoretação em alguns pontos de coleta de algumas cidades e em alguns períodos também foram encontrados e serão objeto de análise posterior. Já São Paulo, Campinas e Sorocaba estão com os índices de acordo, mas isso não ocorre somente em municípios de grande porte, cidades como Jaboticabal, Dourado, Fartura e Macatuba também estão com a quantidade adequada.
O CROSP participa da iniciativa com o envolvimento direto de cerca de 50 fiscais que, criteriosamente, identificaram, em quase um ano de trabalho, as localidades, suas fontes de abastecimento e os pontos para a então coleta de materiais. O CECOL/USP responde pela metodologia empregada. A FOP/UNICAMP, pelas análises laboratoriais.
Essa é a primeira vez que um estudo desse tamanho é realizado no mundo, o censo da fluoretação da água de uma população de 45 milhões de pessoas. No Brasil, as análises até então eram restritas apenas aos municípios com mais de 50 mil habitantes. Em São Paulo, isso resultava em pouco mais de 100 locais, deixando 80% das cidades de fora. “Sem esse estudo, teria sido impossível saber o resultado de algumas cidades, e isso era preocupante, pois sabemos por experiência que quanto mais baixo o Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) e menor a população, a saúde bucal é mais precária e o uso correto do flúor é ainda mais necessário”, afirma o Presidente do CROSP.
“A apuração honrou a assinatura de um termo de compromisso entre o CROSP, o CECOL e a UNICAMP firmado em 2013”, afirma o Prof. Jaime Cury. “No levantamento anterior, divulgados no ano passado, foram cobertos 105 municípios e os resultados negativos comunicados, por ofício emitido pelo CROSP, a cada uma das cidades”, completa Cury.
“Um levantamento desta natureza, que indica caminhos concretos para o benefício da saúde da população, dentre muitos outros desdobramentos, compeliu o grupo a buscar mais do que um critério para a avaliação das análises”, explica o Prof. Dr. Paulo Frazão, membro da Coordenaçãodo CECOL da USP. “Desta forma, o grupo de pesquisadores decidiu fazer a apuração também pela ótica de um consenso técnico do CECOL de 2011, fruto de uma reflexão mais recente e considerado por diversos especialistas um modelo mais apropriado para este tipo de avaliação”, ressalta o Professor.
O Projeto de Lei (PL) nº6359, que tramita na Câmara dos Deputados desde 2013, propõe a revogação da Lei nº 6.050, de 24/05/1974, que determina a obrigatoriedade da fluoretação da água em sistemas de abastecimento quando existir estação de tratamento. “A aprovação desse Projeto seria um retrocesso na prevenção da cárie dentária no estado de São Paulo, que conta com um dos melhores sistemas de prevenção dessa doença em todo o País, desde os anos 1980”, afirma o Secretário do Conselho Regional de Odontologia de São Paulo, Marco Antonio Manfredini.
Nas últimas quatro décadas os níveis de cárie dentária registraram um declínio importante no estado de São Paulo, principalmente em crianças. Entre as medidas de prevenção responsáveis pela melhora da situação estão os cremes dentais fluoretados e a fluoretação das águas. Antes da adição de flúor aos cremes dentais e à água, uma criança de 12 anos de idade tinha, em média, 8 dentes atingidos pela doença. Atualmente esse número não ultrapassa 2 dentes.
Claudio Yukio Miyake Vereador 2023 - Todos os direitos reservados